“Junto a Cruz de Jesus estava de pé sua Mãe, a irmã de sua Mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena.” (Jo 19, 25). João também estava junto de Jesus e de sua Mãe naquele momento (Jo 19, 26-27). Quem estava ali crucificado certo dia disse: “… Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida!” (Jo14, 6a) . Prezado leitor, inicio algumas reflexões sobre questões sociais e políticas a partir destas citações bíblicas. Antes de entrar propriamente nestes temas, gostaria de refletir sobre uma dupla realidade experimentada por aqueles que estavam aos pés da Cruz de Jesus, junto com Maria: beleza e dor! Sim, os olhos da Mãe de Jesus e dos que a acompanhavam enxergavam aquele Corpo tornado como uma única ferida, diante do qual, segundo Isaías, “…se cobre o rosto.” (Is 53, 3). Mas também é verdade que Maria, aquelas outras mulheres, e João viram além dos sinais de destruição: espiritualmente, de tanto amarem Jesus, viram fachos de graça brotando de cada uma das Santas Chagas!
Não podemos cair na tentação de tirar os crucifixos de nossos ambientes, mas precisamos mergulhar na mística da adoração, pela qual enxergamos a bela dinâmica da salvação que continua brotando do único sacrifício de Cristo, o qual se atualiza ao longo do tempo! O que será que esta reflexão tem a ver com questões sociais e políticas?
Partindo da doutrina católica, que nos diz que a Verdade é atualizada, podemos compreender esta realidade, exemplificando com a atualização da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus pelo Santo Sacrifício ou Santa Missa. Mas esta Paixão, Morte e Ressurreição também são atualizadas na própria história, em outras realidades além da própria Santa Missa ou Santo Sacrifício. Se pensarmos nos dois milênios de história do cristianismo, perceberemos a atualização tanto da beleza quanto da dor que foram experimentadas por Maria e por aqueles que a acompanhavam aos pés da Cruz. A beleza refere-se a todas as heranças que a Santa Igreja deu para a Civilização Ocidental, e as dores referem-se às perseguições e infidelidades a esta Igreja, as quais resultaram em várias outras dores, no nível espiritual, cultural e material.
Comecemos pela beleza da história de dois milênios, como atualização da beleza de Cristo na Cruz. Sabemos que a fé católica resultou no surgimento de uma nova Civilização, a Ocidental. Esta surgiu e cresceu em riqueza, no sentido espiritual, cultural, filosófico, jurídico, político, científico, tecnológico etc. Todas estas belas heranças são usufruídas pelos homens ocidentais, e não é exagero dizer que o verdadeiro progresso é um presente da fé católica! Ao redor da mística da Cruz de Cristo e do Seu Santo Sacrifício, os povos ocidentais descobriram a inestimável dignidade da mulher, de todo ser humano e da família, a experiência do socorro mútuo a pessoas que não pertenciam a própria família. Plasmados também nesta mística, nós crescemos no conhecimento do valor inestimável da aproximação a Deus, da vida de oração, das práticas de ascese. Ao redor da bela imagem do Crucificado, frutificaram em nosso meio tantas espiritualidades de santos, de místicos e de outros que foram mártires. Também aprendemos o valor do conhecimento intelectual, e incontáveis gerações de crianças, adolescentes e jovens tiveram a sua razão nutrida ao redor do Crucificado.
Precisamos elevar um forte brado de louvor e gratidão por tanta beleza! Conforme o Professor Felipe Aquino se expressa no título de um dos seus livros, podemos dizer sobre “As riquezas da Igreja”. Podemos também afirmar com aquele Professor, que esta riqueza, cujo componente principal, mas não único, é o espiritual, nutriu os seres humanos, desde os mais ricos aos mais pobres, e a sociedade realmente evoluiu durante muitos séculos, devido a uma herança constantemente acumulada. A vida social e política também evoluíram neste mesmo período, e esta evolução contínua pode ser creditada ao fato de que a sociedade respirava um clima eminentemente católico no lado ocidental do mundo.
Mas também temos, na história destes dois milênios, múltiplas dores, as quais também atualizam as dores de Cristo e daqueles que O adoraram aos pés da Cruz. Estas dores sempre tiveram como núcleo interno a desobediência à Esposa de Cristo, a Igreja Católica, Apostólica, Romana. E estas desobediências também foram feitas por filhos da Igreja, pois ela é Santa e Pecadora. Da mesma forma que no acontecimento do Calvário, ao longo dos dois milênios, muitos filhos da Igreja permaneceram ao redor do Crucificado, mas em atitude de zombaria e de enfrentamento. Fizeram assim os que se intitulavam católicos, enquanto insistiam em ensinos filosóficos, doutrinários, morais e éticos não condizentes com a Verdade. Nesta história, também existiram aqueles que até chegaram aos pés da Cruz, mas deram as costas de maneiras variadas, e a forma extrema foi a apostasia.
Fato é que o afastamento da verdadeira Igreja de Cristo gerou nos corações e mentes humanas consequências deste pecado inicial. Podemos, então, identificar reflexos destas atitudes de descaso, desobediência e negação, em correntes filosóficas, teológicas e políticas que foram alimentando os povos de uma maneira cada vez mais apartada do Crucificado. Podemos dizer que, uma vez que as correntes de pensamento ateístas se espalharam, estamos enxergando atualmente o crescimento de idéias que negam a própria dignidade do ser humano. Onde não se considera a existência de Deus, não há como enxergar no ser humano a imagem e a semelhança de Deus.
Portanto, você é convidado a mergulhar nesta reflexão sobre beleza e dor, ao ler estas reflexões sobre questões sociais e políticas. Digo assim, pois sei que muitos têm rejeição a estes temas, e justificam dizendo que a busca da experiência de Deus seria suficiente para dar testemunho católico. Mas fato é que Deus, quanto mais espaço tem no coração do fiel, mais o incomoda a olhar ao redor. Deus primeiro lança o nosso olhar para este tempo, e em seguida, nos inspira a buscar explicações em escalas de tempo cada vez mais amplas. Deus nos convida a permanecer demoradamente diante do Crucificado, e nos mostra que uma forma de viver esta experiência é também mergulhar em um estudo cada vez mais disciplinado da história da civilização ocidental, e em especial da história da Igreja Católica. Quando assim fazemos, deparamo-nos com belezas nunca imaginadas, e também encontramos a dor das controvérsias, das diferenças de opinião, e a própria dor da reflexão persistente. A separação entre a experiência de dor e a de beleza talvez possa ser feita apenas de modo didático, pois ambas são constantes em frente ao Crucificado.
O mundo contemporâneo precisa que mais pessoas se disponham a carregar esta bela e dolorosa Cruz! Precisamos conhecer cada vez mais profundamente a própria doutrina Católica, e, a partir desta referência segura, mergulhar no conhecimento em outras áreas. Afinal de contas, todas as nossas ações devem brotar de nosso modo de pensar, e este deve ser balizado pela sólida doutrina católica.
Nos próximos artigos, desenvolverei esta temática. Só de imaginar que mais pessoas permanecerão demoradamente diante da Cruz de Cristo também por esta via já causa em mim muita consolação! Seja bem-vindo!
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